Mês: abril 2014

Sobre Romances

romances

Por causa do trabalho, que me exige outras leituras, não tenho lido romances recentemente. E quando leio, não gosto o suficiente para fazer uma resenha positiva, nem odeio o suficiente para entrar no “livros que não são o que parecem”. São aqueles livros que vivem no limbo. Nem são ruins, nem são exatamente bons.

Mas como encontrar um romance legal? Bem, como nem sempre tenho tempo de fazer mil comparações de resenhas (e…bem, vocês sabem que os critérios do pessoal que faz resenha lá fora são diferentes dos nossos, então eu tenho que ficar analisando as resenhas…), geralmente entro em uma livraria, leio a contracapa, as orelhas do livro, a introdução e as primeiras vinte páginas. Se me interessar, talvez eu leia alguma página do meio. Se parecer legal, dou uma espiada no final para ver se alguém morre…hahaha… (digamos que Nicholas Sparks me deixou traumatizada e não quero repetir a experiência). Se bem que não vou deixar de ler um livro bom só porque o autor resolveu fazer uma chacina no final, tenho que pesar as outras impressões.

Basicamente, gosto de livros como – e eu uso sempre esse exemplo ao falar de romance porque, para mim, é O exemplo – “Amor de Redenção”. Quando terminei de ler a última página deste livro, eu não estava chorando. Eu estava pensando em tudo o que tinha lido. Fiquei pensando nele vários dias e tentando analisar a história, pensando nos personagens… É realmente uma marca profunda a se deixar em um leitor. É isso o que eu procuro em um bom livro. Claro – e alguém vai falar – ah, mas existem livros que são só entretenimento. Claro que sim. Mas porque é entretenimento tem de ser meramente emocional? Eu optaria por um livro de suspense, de ficção científica ou policial. Prefiro exercitar meu cérebro – e não meu coração – ao ler um livro. Para exercitar meu coração, eu ando na esteira.  Mas cada um sabe o que faz com seu tempo.

Posso elencar três exemplos do que devemos evitar (se encontrar isso em um livro, fuja para as montanhas):

1 – Caso você procure resenhas de um determinado livro e constate que 98% dos leitores dizem algo como “chorei convulsivamente” ou “derramei lágrimas do início ao fim, esse não é um livro que mereça o seu tempo. Você vai alimentar a sua emoção e possivelmente vai chorar também. Não que um bom texto não possa emocionar, mas se isso for tudo o que as pessoas tiverem para dizer do livro, a probabilidade de que seja bom é muito pequena.

2 – A moça é casada e se apaixona instantaneamente por outro homem, e o autor jura que o amor é verdadeiro (oi, Nicholas Sparks). Mentira. Eu não perco meu tempo com histórias de amores que surgem do nada. Amor não brota da noite para o dia feito feijão mágico. Quer condicionar seu cérebro a uma forma errada de ver as coisas?

3 – O livro é todo sobre pornografia, satanismo, bruxaria ou anjos. Ok, não vamos fazer uma inquisição e achar que todo livro que tem uma ou outra eventual cena de sexo ou  algum pano de fundo de seres mitológicos (como vampiros, zumbis, faunos e outras criaturas mitológicas) são do mal. O problema é com livros que falam excessivamente sobre sexo (ou sobre relacionamentos baseados em sexo, tipo 50 tons de cinza) ou que usam a história como desculpa para falar de forma distorcida sobre coisas que existem (como satanismo, bruxaria, anjos, demônios e Deus). Tudo o que distorce coisas que são importantes para você não deveria ocupar o seu tempo.

 

Por falar nesse último item, dia desses li um estudo que mostrava que ao ler ficção, o cérebro responde como se estivesse vivenciando aquela história. Sério, o cérebro entende que você está vivendo aquelas coisas. Como isso pode não moldar o comportamento das pessoas? Isso me lembra algo que li sobre como a literatura e o cinema distorceram a forma do ocidente entender o amor…a ficção é muito mais poderosa do que se imagina para moldar a forma da sociedade enxergar o mundo.

(A propósito, eis a resposta a quem lê minha resenha do filme Noé e, indignado porque queria assistir ao filme sem peso na consciência, diz que “é só um filme”. Profunda ignorância a respeito da influência do entretenimento ao moldar o comportamento e a forma de entender a sociedade e – no caso – Deus e a história bíblica.)

E eu gostaria de pedir a vocês algumas sugestões de romances que vocês tenham visto por aí e queiram que eu leia para resenhar (ai, que medo de pedir isso…hahaha). Lembrando que considero romance qualquer narrativa de ficção com mais de 100 páginas, não precisa necessariamente falar de amor (o nome “romance” não tem a ver com amor, mas com o período histórico em que esse gênero literário se popularizou, o “Romantismo”).

Podemos entender melhor nossa sociedade por meio da literatura de ficção que ela produz. Como pensamos, o que fazemos, o que esperam que façamos. Então talvez eu comece a resenhar mesmo os livros que estão no limbo, para fazer essa análise de como nossa sociedade pensa. Vou ser execrada por alguns…rs. Mas fica a critério de vocês, pode ser uma boa forma de entender como ler o mundo.

 

*A imagem é meramente ilustrativa, tá?

Vanessa Lampert

Quer ler todas as resenhas? Clique aqui.

 

PS: Mesmo os livros que eu já li, gosto de reler antes de resenhar. É que eu leio diferente quando leio para resenhar…rs.  Só que desde o ano passado eu entrei em um período em que preciso ler coisas mais técnicas e que se relacionem com o trabalho. Mais ou menos o que a Patricia falou sobre José esta semana.

PS2: Antes que alguém pergunte, tenho conversado com duas amigas (que vocês conhecem) a respeito da gente começar a produzir romances saudáveis, com a nossa forma de enxergar as coisas. Amor em Ruínas, da Cristiane, vai sair já com essa visão, e mais projetos virão no futuro. :-D

*Post originalmente publicado no blog da Cristiane Cardoso. Clique aqui para ler a postagem original.

Filmes Que Não São O Que Parecem – Noé

Traída por um trailer. Foi assim que me senti durante a exibição de “Noé”, do cineasta Darren Aronofsky. Quando vi o trailer, fiquei maravilhada. Os efeitos especiais, o clima da época, a cena em que o líder dos inimigos diz a Noé: “ Tenho soldados à minha disposição e você sozinho me desafia?” Então, Noé, confiante e tranquilo, responde: “Eu não estou sozinho.” –  Uau! Há muito tempo esperava uma superprodução das histórias maravilhosas do Antigo Testamento. Com os recursos que temos atualmente, daria para fazer cenas grandiosas. Mas…era tudo falso, meus amigos. Cada cena daquele trailer foi cuidadosamente montada para enganar a mim e a você.

Não é nem questão de o filme não ser fiel à Bíblia apenas. É muito pior do que isso. Ele simplesmente conta outra história. Se fosse considerar esse filme realmente como uma interpretação do texto de Noé, eu diria que é uma versão satanista. E olha que não sou adepta de teorias conspiratórias, e não saio por aí chamando qualquer coisa de satanista.

Segundo o filme, quando o Criador expulsou o homem do Paraíso, após Adão e Eva terem desobedecido, um grupo de anjos, que sabia que havia algo de bom no homem (afinal de contas, era a imagem do Criador), ficou com pena da humanidade e resolveu descer para ajudar. O Criador, intolerante, entendeu como traição e puniu aqueles anjos, condenando-os a morarem na Terra, amaldiçoados.

Eles eram luz, mas a partir deste momento, se tornaram gigantes de pedra, fisicamente deformados e tortos (algo como um cruzamento dos Ents, do Senhor dos Anéis, com o monstro de pedra, de História sem Fim e algum parentesco com um monstro de lava – todos em grave estado de desnutrição e com problemas sérios de coluna), mas ainda gente boa. Ensinaram ao homem tudo o que sabiam a respeito da Terra, porque eram bonzinhos e queriam ajudar. Se tornaram os Guardiões e acolheram os filhos de Caim.  Só que foram traídos e desprezados pelos homens, que desvirtuaram o que aprenderam.

Siiim, meus amigos, os demônios, segundo esse filme, são apenas seres bem intencionados que queriam ajudar… Na verdade, em todo o filme, os únicos personagens que despertam alguma empatia no público são esses anjos caídos. Estranho, não? A gente chega a sentir pena deles, pois parecem injustiçados. São bons e simpáticos. Você percebe neles respeito por Deus (!!) e os homens os chamam de “servos do Criador”. Essa perspectiva e a distorção do caráter de Deus, do porquê ele escolheu Noé e a distorção do caráter dos próprios demônios (que, na verdade, caíram porque foram egoístas e orgulhosos, nunca tentaram ajudar ninguém), faz com que eu desconfie seriamente que o filme foi inspirado por um demônio que queria se autopromover.

Como não se trata do Noé que a gente conhece, vou chamá-lo de “Nãoé”. :) No início do filme, os filhos de Caim matam o pai do pequeno Nãoé e roubam uma pele de cobra que ele usava para fazer um ritual de “transferência do direito de primogenitura”, algo como tornar-se protetor do meio-ambiente. Os filhos de Caim são malvados porque exploraram os recursos naturais até que a terra se tornasse árida, comem carne, vivem como seres bestiais famintos (isso eu não entendi. O lugar não tem vegetais e os carnívoros é que passam fome?) e não têm educação.

Um dia, Nãoé sonha com gente morta debaixo dágua e entende que o Criador destruirá o mundo. Sabe que tem que fazer alguma coisa, mas não sabe o quê. Como viu também no sonho a montanha em que mora (sozinho) o avô Metusalém, segue para lá com a família. No caminho, encontra um vilarejo destruído e uma menina ferida, Illa, quase da idade de seu filho Sem (todos os filhos de Nãoé são pequenos). Adota a menina. Na estrada, também encontram os demônios gigantes de pedra com problemas de coluna. Desconfiadas, as criaturas não aceitam ajudar a família e deixam todos em uma vala. No entanto, um gigante com cara de dó volta durante a madrugada para ajudá-los a escapar e segue com eles até a montanha.

Vovô Metusalém é uma espécie de bruxo ou xamã. Dá um chazinho alucinógeno para Nãoé, que vê a arca. (Não é Deus que fala com Noé, é o alucinógeno de Metusalém.) Ele também dá uma semente mágica do Éden a Nãoé, que a planta na terra seca. Essa semente é tipo um feijão mágico vitaminado. Quando os outros demônios vêm levar o demônio traidor, entendem que Nãoé realmente falou com o Criador e resolvem ajudar. Uma floresta cresce em cinco minutos (super feijão mágico) e Nãoé vê ali a madeira para a sua arca. Mãos à obra! A família começa o trabalho, mas quem realmente faz a arca é o diabo e os demônios! Em dez anos, concluem o trabalho. (Na Bíblia levou cem anos, mas no filme, com a ajuda dos demônios, apenas dez.)

Nãoé se convence de que nenhum humano merece viver, nem mesmo sua família. Começa a se tornar egoísta e fanático. Se despersonaliza e agora acredita que a missão deles é salvar os animais, que são inocentes, e manter a Terra limpa dos humanos. Humanos, a sujeira do universo. Ele não é escolhido pelo criador por ser bom, mas por ser obsessivo o suficiente para completar a tarefa. Enquanto no original:

“Disse o SENHOR a Noé: Entra na arca, tu e toda a tua casa, porque reconheço que tens sido justo diante de Mim no meio desta geração.” (Gênesis 7.1)

O filme tenta distorcer a noção de “justo” e “justiça”, usando essas palavras fora de contexto diversas vezes, para tentar transformar Noé e Deus em algo que eles nunca foram. Imagino que possa causar confusão na mente de pessoas que não têm muita noção de quem Deus é e se sentem perdidas em um mundo com tanta maldade e injustiça. Sutilmente elas serão levadas a uma interpretação distorcida da mensagem original.

Arca pronta, os animais começam a entrar e são colocados para dormir com uma fumaça-sonífero. Aí, vamos ao anticlímax total: lembra daquela cena do Trailer? Aquela que eu achei superforte, em que o líder dos inimigos diz a Noé: “Tenho soldados à minha disposição e você sozinho me desafia?” Então, Noé, confiante e tranquilo, responde: “Eu não estou sozinho”.

Pois é…no trailer parecia que ele estava falando de Deus. No filme, quando ele diz isso…adivinha? Se levantam atrás dele todos aqueles demônios de pedra. Só pode ter sido de propósito. Quem quer que tenha montado aquele trailer estava realmente a fim de fazer uma piadinha de mau gosto.

Nem a narrativa presta. O filme tem muitas cenas inúteis e sem noção. Por exemplo, em um momento que deveria ser tenso, quando Cam foge para procurar uma esposa justo na hora de fechar a arca, Illa (namorada/esposa/irmã adotiva de Sem) sai atrás de Cam e encontra o vovô Metusalém na floresta. Ele dá um passe que a deixa com dor de barriga e meio ninfomaníaca. O mundo está acabando, mas Ila ataca Sem no meio do caminho, totalmente sem noção do momento ideal (e do local apropriado) para se fazer as coisas (sério, ela começa a beijar ele e você entende que vão tirar a roupa ali mesmo…).

O diabo (líder dos demônios) morre defendendo a arca, pede ao Criador que o perdoe, vira novamente um anjo luminoso e vai para o céu (momento piada que me fez rir), enquanto o outro (que tem cara de coitadinho) diz, com voz abobalhada: “o Criador levou ele para casa!” Então…todos eles querem defender a arca para serem levados de volta para o céu…e, de fato, são. Quer dizer, o diabo é bom, Deus não está nem aí para ninguém (além de ser psicopata, está muito, muito longe. Não dá para contar com Ele) e o homem é que é ruim. No filme, não tem como se livrar do mal, pois ele está dentro do ser humano. A saída? Não dá para entender racionalmente, não. Tem a ver com amor-sentimento e se deixar levar pelo coração. Bela pregação do inferno e completamente contrário ao que a gente acredita.

Dentro da arca, a família infeliz ouve os gritos das pessoas lá fora e insiste com Nãoé para resgatá-las, pois são pobres pessoas inocentes e famintas (manipulação emocional descarada).

“Viu o SENHOR que a maldade do homem se havia multiplicado na terra e que era continuamente mau todo desígnio do seu coração” (Gênesis 6.5) Ou seja, não eram homens famintos buscando comida. Não eram pessoas inocentes, coitadinhas, ignorantes cujo maior erro era comer animais. Não eram pobres criaturas injustiçadas. Era continuamente mau todo desígnio do seu coração. Todo desígnio do coração. De todo mundo, exceto Noé. Como eles iam se arrepender? Como poderiam mudar se não conseguiam enxergar seu erro? E, versículos 7 a 9:

“Então, se arrependeu o SENHOR de ter feito o homem na terra, e isso Lhe pesou no coração. Disse o SENHOR: Farei desaparecer da face da terra o homem que criei, o homem e o animal, os répteis e as aves dos céus; porque me arrependo de os haver feito. Porém Noé achou graça diante do SENHOR. Eis a história de Noé. Noé era homem justo e íntegro entre os seus contemporâneos; Noé andava com Deus.”

A ideia não era extinguir o homem, mas começar de novo. Deus escolheu Noé porque ele era diferente do restante da humanidade. E decidiu destruir o resto porque, entenda: pessoas vivendo na maldade e na injustiça já estavam mortas diante dEle. Apenas oficializaria sua condição.

Algum tempo depois, Ila descobre que está grávida ao cuspir em uma folhinha mágica…tipo um teste de farmácia pré-diluviano…hahaha… O problema é que Nãoé está convencido de que o criador quer exterminar sua família (Nãoé não leu a Bíblia). A notícia estraga o plano perfeito para a extinção da humanidade. Ele fica revoltado e tem mais um surto psicótico. Acredita que o Criador quer que ele mate o bebê, se for menina, para evitar que faça mais homenzinhos.

Obviamente, como o leitor já adivinhou, vai ser menina. Mas a partir daí o filme vira um dramalhão mexicano, com tentativas de manipulação emocional e tom sombrio, com Nãoé piradão andando pela arca com cara de psicopata e sua esposa magoada e histérica. Não há fé ou demonstrações de grandeza interior. E o Deus do filme é totalmente ausente, omisso, intolerante e cruel. Mais ou menos o que pensam dEle os que interpretam a Bíblia de modo raso e infantil.

Resumindo, Illa entra em trabalho de parto e tem gêmeas. Na hora em que vai esfaquear a cabeça das criancinhas, Nãoé sente amor no coração e o amor vence o ódio. O ódio, no caso, era a ordem do “criador”. Quando resolve desobedecer, Nãoé consegue ser sensato. (oi?)

Mesmo com o conflito resolvido, ao sair da arca, ninguém mais é feliz, nem inocente. Todo mundo matou ou pensou em matar. Não fala de aliança entre Deus e a humanidade, a mensagem original não é passada, o sentido original é distorcido. A história linda descrita nos capítulos 6, 7, 8 e 9 de Gênesis foi transformada em uma palhaçada. Gastaram milhões para enganar os espectadores e fazer uma babaquice pior do que Transformers. Mas dá dinheiro, e isso é o que Hollywood quer. Em um mundo onde o ceticismo burro impera e é fora de moda dizer que acredita em Deus, “Noé” consegue a proeza de enganar cristãos e ateus. Os primeiros, vão assistir por achar que é um filme espiritual. Os outros, vão assistir achando que não é espiritual.

O filme termina, sem que você tenha muita ideia de qual foi a intenção. Um sermão ecológico sobre não destruir os recursos naturais e se manter vegano mesmo no deserto? Uma discussão existencialista sobre “o ser humano merece viver?” Um filme de ficção com batalhas sem graça e personagens rasos? Um filme de terror com sangue espirrado, corpos em estado de putrefação e homens bestializados matando e morrendo por fome? Uma novela mexicana?

Um filme sem graça e mal escrito, pesado e arrastado, com personagens rasos e histórias ridículas. Há quebra de ritmo em diversos pontos e o personagem principal fica doido de uma hora para outra. É risível. Meu marido comentou que apenas dois filmes fizeram com que ele tivesse vontade de sair do cinema antes de terminar. Noé e “The Fountain”. Por coincidência, ambos de Darren Aronofsky. Cansativos, pretensiosos, arrastados, emocionalmente carregados e com tendências ecologico-newage-existencialistas.

O “Noé” do filme não tem nada a ver com o personagem original; o Deus do filme não tem nada a ver com o Deus da Bíblia, a história do filme não tem nada a ver com a história da Bíblia. O roteiro é tão ruim que precisou de um trailer-isca para enganar os incautos. Quero ver se pegassem um livro do Tolkien e fizessem uma distorção desse nível. A essa altura você teria uma porção de nerds dilacerando o roteirista e organizando boicotes em massa. Nunca mais o estúdio se atreveria a fazer algo parecido. O pessoal já ficou indignado porque no segundo filme do “Hobbit” acrescentaram uma personagem que não existia no livro! Imagina se alterassem toda a história, personalidade e caráter de absolutamente TODOS os personagens? O trabalho foi malfeito, mesmo. Eu me senti enganada, traída e assaltada.

Para mim, o verdadeiro roteirista desse filme (por trás do ser humano) foi o mesmo espírito que falou com o amigo perturbadinho de Jó…

“Uma palavra se me disse em segredo; e os meus ouvidos perceberam um sussurro dela. Entre pensamentos de visões noturnas, quando profundo sono cai sobre os homens, sobrevieram-me o espanto e o tremor, e todos os meus ossos estremeceram.

Então, um espírito passou por diante de mim; fez-me arrepiar os cabelos do meu corpo; parou ele, mas não lhe discerni a aparência; um vulto estava diante dos meus olhos; houve silêncio, e ouvi uma voz: Seria, porventura, o mortal justo diante de Deus? Seria, acaso, o homem puro diante do seu Criador? Eis que Deus não confia nos seus servos e aos seus anjos atribui imperfeições; quanto mais àqueles que habitam em casas de barro, cujo fundamento está no pó, e são esmagados como a traça! Nascem de manhã e à tarde são destruídos; perecem para sempre, sem que disso se faça caso. Se se lhes corta o fio da vida, morrem e não atingem a sabedoria.” (Jó 4.12-21)

E:

“Que é o homem, para que seja puro? E o que nasce de mulher, para ser justo? Eis que Deus não confia nos seus santos; nem os céus são puros aos Seus olhos, quanto menos o homem, que é abominável e corrupto, que bebe a iniquidade como a água!” (Jó 15.14-16)

Esse é o espírito que ajudou a escrever o roteiro de “Noé”. Não é um raciocínio muito semelhante? A forma de distorcer as coisas, dizendo que o diabo não é mau, Deus é que atribui imperfeição a tudo! E o ser humano é um nada, pó, ridículo e desprezível. Essa é a visão do diabo, não de Deus.

O objetivo de Deus sempre foi conseguir uma forma de redimir a humanidade, a quem Ele ama e sempre amou. O diabo nos despreza e sente profunda inveja porque Deus deu ao homem o privilégio de ser chamado Seu filho e de cuidar de tudo o que Ele fez. Se alguém tivesse clamado, querendo ouvir a Deus, como o chefe malvado fez em certo momento do filme, certamente ele não teria ficado de fora.

“Desviando-se o justo da sua justiça e praticando iniquidade, morrerá nela. E, convertendo-se o perverso da sua perversidade e fazendo juízo e justiça, por isto mesmo viverá.” (Ezequiel 33.18,19)

O filme não mostra as falas maravilhosas de Deus, seu amor pela humanidade, sua misericórdia, sua aliança com Noé… além de destruir a imagem de Deus e o que Ele pensa da humanidade, faz parecer que obedecer a Deus é algo ruim, que transforma homens pacatos em psicopatas…

Espero que esse texto ajude a evitar que você gaste seu suado dinheirinho com algo que não vale nem um centavo, principalmente por passar uma mensagem mentirosa. E espero que evite que você gaste duas horas e meia de sua vida com uma bobagem desse nível. O alerta é para que ninguém mais seja enganado como eu fui. Há uma diferença enorme entre um filme que assume que é mera ficção, fantasia, e um filme que finge ser uma coisa no trailer e é outra na exibição.

Vanessa Lampert

PS: Agora você consegue entender a campanha: “Eu não vou assistir a Noé” que tomou conta do Instagram ontem. É tanta baboseira no filme que nem dá vontade de comentar, só de alertar os amigos para que não percam tempo. Mas como muita gente estava achando que o que tinha de diferente da Bíblia era só uma ou outra adaptação e estava curiosa para assistir, achei que seria importante escrever.

PS2: Quer economizar seu dinheiro e seu tempo, mas ainda quer saber mais detalhes da história? Eu escrevi a sequência completa do filme, para que você conheça a história sem precisar gastar duas horas e meia no cinema. Mas ficaria grande demais para colocar aqui, então vou deixar o link. Clique aqui para ler.

PS3: Quanto aos efeitos especiais, sinceramente, não vi nada que já não tivesse visto em outros filmes. Eu entenderia o argumento de “ver por causa dos efeitos especiais” se estivéssemos falando de Avatar, por exemplo, que cria outro mundo, ou mesmo Senhor dos Anéis. “Noé” peca até nisso. Para quem está habituado a filmes com efeitos especiais, é fraco.

UPDATE: Não achei que precisaria explicar isso, mas vamos lá: Na Bíblia, os anjos que ficaram no céu são anjos. Os que caíram, são demônios. No filme, os Guardiões são anjos caídos, logo, demônios. O chefe deles chama-se Samyaza, nome identificado com o líder dos demônios no livro apócrifo de Enoque. Então, eu não estou inventando nada quando chamo os gigantes de pedra de demônios. O básico de qualquer adaptação cinematográfica é manter-se fiel ao espírito do original. Isso é teoria do roteiro. Você pode (e deve) adaptar à linguagem do cinema, omitindo algumas coisas e criando outras, para que a história flua bem na tela e seu roteiro seja original, mas sem descaracterizar a história, ou é melhor chamá-la de outra coisa. O que Aronofsky fez em “Noé” não é uma adaptação.

Para quem assistiu a (ou leu) “Senhor dos Anéis”: é como se ele fizesse um filme em que Sauron é bonzinho, os Orcs ajudam os habitantes da Terra Média e o anel deixa as pessoas melhores…e chamasse isso de “Senhor dos Anéis”. E no trailer, desse a entender que seria uma adaptação. Seria visto como um roteirista incompetente e execrado pela opinião pública e crítica especializada. E Hollywood já fez boas adaptações, inclusive bíblicas, mas em um passado muuuito distante.

 

*Texto originalmente publicado no blog Cristiane Cardoso