Mês: novembro 2013

Não entendo os seres humanos

A pessoa tem um cachorro e passa o dia gritando com ele para que ele não pule, não lata, não corra, enfim, não faça coisas que cachorros são programados para fazer. “Para de pular, Max!” “Para de latir, Max!” “Para de rosnar, Max!” “Deita, Max!” O pobre do Max teria de ficar deitado o dia inteiro, se quisesse agradar seus donos.

Cachorros latem. Gatos miam. Peixes fazem bolhinhas na água. Não tem como fugir dessas coisas básicas do reino animal. Se não quer um animalzinho que fique pulando em você, latindo, com a língua para fora, arfando e querendo brincar, não adote um cachorro. O que acontece é que as pessoas não pensam. Isso. Damos voltas e voltas e chegamos sempre ao mesmo assunto. As pessoas ligam o piloto automático e simplesmente reagem. Reagem às situações, reagem aos seus sentimentos, aos seus impulsos, aos seus instintos… Veem aquele filhotinho fofinho que parece um ursinho de pelúcia…”Ah, o Joaquinzinho vai adorar ter um cachorrinho para brincar” e pronto, levam para casa um ser que não é nem um ursinho de pelúcia, nem um brinquedinho. Não vai demorar muito para a frustração chegar.

Se tivessem pensado, raciocinado e percebido que o filhote ia crescer, que provavelmente não teriam tempo ou paciência de levar para passear, que ele iria latir e eles se irritariam, que teriam de levar para tomar banho, gastar com ração, castração (não, esse tipo de gente não castra, porque para decidir castrar a pessoa tem que pensar, também), veterinário, etc. etc. etc… Nem vou falar dos cuidados e gastos que se deveria ter com um gato, senão o post não terá fim e eu preciso terminá-lo em quatro parágrafos. Enfim, se eles tivessem pensado, provavelmente perceberiam que não estavam dispostos a se responsabilizar por um bichinho. E o Max hoje poderia estar mais feliz (se bem que acho que ele não tem muita noção disso tudo, então me parece bem feliz mesmo assim, tadinho).

Mas o que eu queria? As pessoas fazem isso com todas as outras escolhas! Não pensam na hora de escolher alguém para casar, não pensam na hora de definir uma profissão, não pensam na hora de decidir trazer outra criança a este mundo… não pensam. No entanto, nunca é tarde. Os donos do Max bem que poderiam se dar conta de que, enfim, o cachorro já está na casa deles. Já é responsabilidade deles. Então, o mínimo que eles podem fazer é cuidar direito. Se derem mais atenção a ele, provavelmente, ele ficará menos estressado, menos ansioso e se comportará melhor. Se aprenderem a lidar com o cachorro, continuarão tendo um cachorro (não será possível transformá-lo em alguma coisa que não pule, não lata e não faça xixi de alegria, por exemplo), mas terão um relacionamento melhor com ele, seus dias serão mais tranquilos e os vizinhos, certamente, dormirão mais felizes.

 

Duvide da dúvida

Li o post “Dúvidas sobre a Fogueira Santa” e acho que tem algo que precisa ser explicado para que as pessoas consigam pegar o espírito da Fogueira Santa. Muita gente nunca percebeu que a palavra “sacrifício” tem mais de um significado. O sentido mais usado pelo mundo para essa palavra é “sofrimento”. A gente fala “sacrifício” e as pessoas logo pensam em sofrimento extremo, quase como uma penitência. Mas a palavra “sacrifício” na Universal é usada no sentido mais esquecido do dicionário: renúncia.

No dicionário Michaelis esse significado aparece assim: “Renúncia voluntária a um bem ou a um direito”. É esse o nosso sacrifício. Não é dar alguma coisa para ficar sofrendo, se torturando, na esperança de que o sofrimento alcance alguma coisa, mas renunciar voluntariamente a algo que Deus pediu, sabendo que aquela renúncia trará o resultado que Ele prometeu. A renúncia é algo pensado, é uma atitude do espírito. Já o sofrimento, é da alma, do coração e, às vezes, do corpo.

Eu entendo a confusão. A cultura católica glorifica o sofrimento. Tanto é que o catolicismo dá um foco muito grande à dor física de Jesus na cruz, como se isso, por si só, fosse o sacrifício. Sendo que a maior dor dele foi ter renunciado voluntariamente à sua conexão com o Pai (principalmente), à sua paz de espírito e pureza (pois carregou os nossos pecados) e ao seu direito de viver, para que tivéssemos vida. Seu sacrifício foi espiritual, foi de renúncia. O sacrifício físico, da morte, apenas simbolizava o sacrifício espiritual, que nos livrou da morte eterna.

A cultura católica acha que quem sofre é santo. Mas o santo mesmo é o que renuncia. O que abre mão de suas vontades, o que renuncia ao direito de revidar, de responder, o que renuncia à desordem, o que renuncia ao seu direito animal de viver de acordo com seus instintos e impulsos, o que renuncia ao direito de pertencer a si mesmo, o que renuncia à indisciplina, o que renuncia à sua própria vida, o que abre mão de um bem ao qual é apegado, o que renuncia ao direito de ter no dinheiro a sua segurança… O que se entrega, renuncia.

Esse é o sacrifício que se faz no mundo, sem saber. O estudante que renuncia ao seu direito de dormir para estudar, aquele que renuncia às baladas para ter um namoro firme, o que renuncia aos doces para manter a saúde, o que renuncia ao sedentarismo para se exercitar, o que renuncia ao direito de gastar consigo mesmo para investir em alguma coisa, o que renuncia à preguiça para ler um livro…

E quando o pastor diz que o sacrifício tem que doer, é verdade, mas essa dor não é católica, não é física. Porque a renúncia dói mais do que a dor física ou do que o mero sofrimento. É a dor da alma sendo disciplinada pelo espírito. É a dor que nos faz mais fortes, pois nos faz dependentes de Deus. E entendo que é esse o critério que Ele usa ao nos pedir o sacrifício. E aí (ao ver o sacrifício como renúncia, e não como sofrimento) começamos a entender quando o pastor diz que Deus nos pede para nos dar mais. Ele pede o que estava atrapalhando (e, às vezes, a gente nem notava) e, ao renunciar, nos vemos livres para coisas maiores, pois saímos da zona de conforto que nos acomodava. Rompemos nossos limites, fazemos o que jamais teríamos feito por conta própria, às vezes sem nem entender por que Deus pediu aquilo, mas confiamos que Ele sabe o que faz e, nessa confiança, fazemos o nosso sacrifício. Cremos, por isso, entregamos.

Esse é o espírito da Fogueira Santa.