Tag: romance

Sangue Quente*

Começo esclarecendo que “zumbi” não é um tema que me agrade. A saída de Isaac Marion, no entanto, é surpreendente. Ele teve coragem de contar uma história diferente, e fiquei grata por isso, pois abri o livro sem nem mesmo saber do que se tratava. “Sangue Quente” (“Warm bodies”, no original…e a tradução do título, nesse caso, foi feliz, já que “Corpos quentes” teria uma conotação sensual que o livro não tem), da editora Leya, é um romance escrito em uma linguagem de fácil leitura, mas que em momento algum é pobre ou infantil.Pelo contrário, o cara escreve muito, muito bem. Se você gosta de escrever, vale a pena ler só para analisar o jeito dele contar a história. Vou cuidar para colocar apenas os spoilers que já estão na sinopse do livro, na contracapa e na orelha. Aí ninguém pode reclamar que revelei alguma coisa…rs…A menos que você leia um livro sem ler a contracapa e a orelha, coisa que não recomendo.

Me espantei logo de cara com o bom ritmo e pelo fato de ser narrado em primeira pessoa por um zumbi, o que torna a história surreal ainda mais surreal, mas convence. R. não lembra do próprio nome, não lembra de nada de sua vida e o autor não se preocupa em dar muitas respostas (em certo ponto o leitor para de perguntar, pois vê que algumas questões não são relevantes). No livro, como em qualquer ficção, zumbis comem seres humanos. Se você já assistiu a um filme de zumbi, deve se lembrar que eles gostam especialmente de cérebro. Finalmente, temos uma explicação plausível: ao ingerir o cérebro, os zumbis têm um breve lampejo da vida de sua infeliz vítima. É quase como uma droga que faz com que eles consigam ter a sensação de viver novamente. São poucos instantes, então eles querem mais. É triste, pois em seguida voltam às suas vidas de mortos-vivos…aliás, assim são as emoções e diversão que este mundo oferece: pequenos pedaços de entusiasmo, alegria temporária e depois…voltam às suas vidas de mortos-vivos. Quantas pessoas assim você conhece? O “cééérebro” que elas comem é o álcool, são as drogas, as baladas, o namorado, um hobby, a religião, a filosofia, o sexo, a internet…mas nada é suficiente para lhes dar vida de verdade. O vazio se torna ainda maior após o efeito ter passado

Tudo vai bem até que ele come um cérebro diferente. Por algum motivo, as lembranças deste cérebro são mais intensas (viaje na história, ok? É um mundo onde isso é possível…risos…) e ele tem vontade de proteger a menina que o dono do cérebro amava. Ele a leva consigo, juntamente com o restinho do cérebro do rapaz, que vai degustando como aperitivo por grande parte do livro. O ritmo fica um pouco mais arrastado lá pelo meio do livro, mas nada que prejudique a leitura, depois acelera novamente.

Muita gente não gostou desse livro porque apesar do universo de “R” ser triste, a narrativa é claramente otimista. Mesmo quando ele descreve os sentimentos de um rapaz depressivo (o dono do tal cérebro), você percebe o quanto aqueles pensamentos não têm sentido e fica com vontade de sacudir o cara…é o escritor que te faz entender isso, de maneira muito sutil. Enquanto o garoto justifica sua falta de esperança, o jeito do autor escrever te faz ver o quanto ele estava errado em desistir de lutar. Também fica claro o quanto Isaac se divertiu ao escrever o livro e talvez por isso a leitura seja tão agradável.

O interesse por uma menina viva faz com que o zumbi comece a descobrir a vida, aos poucos, e a mudança em sua realidade acontece de maneira natural. Você pode encaixar várias metáforas nessa história. Aliás, eu li o livro como uma grande metáfora da sociedade. Inclusive algo que o Bispo Macedo disse em uma reunião de domingo na João Dias me fez lembrar deste livro na hora. Ele comparou as pessoas que não nasceram de novo a zumbis. Quem não teve um encontro com Deus vive como R. e seus amigos no início do livro, mortos-vivos, corpos vazios vagando pelo mundo em busca de céééérebros… Depois que conhecem a Deus, começam a viver.

Não, o Bispo Macedo não leu este livro…rs… No entanto, esse despertamento de R. diante do amor é semelhante ao que acontece quando a pessoa finalmente nasce de Deus e começa a descobrir o que é viver, esse paralelo é bem real. Depois que terminei de ler, pesquisei na internet para ver aos outras opiniões. Vi muita gente elogiando, alguns criticando sem ter lido (esse é o ápice da ignorância) e outros falando mal porque o livro tinha uma mensagem de esperança. É mole? O mundo – principalmente o dos “intelectualóides” – padece de um mal chamado “culto à desilusão” onde só tem valor e é considerado bonito o que for triste, pessimista e negativo.

Bem, voltemos ao livro. O relacionamento entre o zumbi e a moça é contado de forma delicada, e é – por motivos óbvios – algo não físico. Ela não se interessa pelos belos olhos azuis dele ou por seu corpinho apodrecido, mas por quem ele é. Ela é meio desmiolada e o escritor coloca em sua boca alguns poucos palavrões que achei desnecessários, meio fora de contexto, mas você acaba fazendo algumas concessões quando o livro é bom, e essa é uma delas. A ideia dele certamente foi mostrar o contraste entre a personalidade dos dois. O zumbi se interessa por ela justamente por causa de seus excessos. Ela transborda vitalidade, como toda adolescente, e ele anseia por um pouco daquela vida. Mas como ela poderia gostar dele? Ainda que gostasse, como ficariam juntos em um mundo em guerra, semidestruído, em que os Zumbis são monstros canibais que se espalharam, obrigando os humanos a viverem escondidos em estádios fechados, como minorias acuadas, à beira do fim da civilização? Como ele poderia ser aceito no mundo dela? Como ela poderia sobreviver no mundo dele?

Ah, também vi comentários de pessoas indignadas por ele ter “maculado a mitologia zumbi”…isso é ridículo. Zumbis não existem, e desde que haja uma boa premissa e o cara consiga explicar tudo direitinho, pode escrever o que quiser, de acordo com a imaginação dele, afinal de contas, é ele que está criando esse universo (diferente de quando você escreve um romance realista). No caso, ele não quis descaracterizar o zumbi, apenas mostrar o que acontece lá dentro, por trás da aparência de cadáver ambulante. Os zumbis do livro comem cérebro e atacam as pessoas grunhindo. Eles não conseguem articular palavras e os pensamentos são bastante diferentes dos vivos, mas você acompanha um desenvolvimento emocional improvável e até um tanto quanto frio de R, mas bastante verossímil.

Eu descubro que gostei mesmo do livro quando me pego incentivando outras pessoas a lê-lo e foi assim com Sangue Quente. Tudo bem que um ou outro me olhou meio atravessado por ter preconceito contra zumbis…rs…mas como os direitos do livro já foram comprados e talvez o filme não seja tão bom quanto o livro, achei melhor informá-los a respeito antes que Hollywood estrague tudo.

Vanessa Lampert

(Você também me encontra no Twitter , no Facebook e no Meu Blog)

Quer ler todas as resenhas? Clique aqui.

* Resenha originalmente publicada em:

http://www.cristianecardoso.com/pt/portfolio/livros/

A Esperança de Uma Mãe

(Esta resenha contém pequenos spoilers) Por ser da mesma autora de Amor de Redenção, Francine Rivers, é natural que comparemos as duas obras, até porque têm praticamente o mesmo número de páginas. “A Esperança de uma mãe” (Her mother’s hope), ao contrário de Amor de Redenção, demora a engrenar. Talvez por se tratar de um projeto pessoal da autora, um romance baseado em mulheres de sua família, ela tenha se preocupado demais em colocar todos os elementos reais: detalhes dos lugares, um pouquinho de drama, fatos históricos…e se esquecido de desenvolver a narrativa com alguma leveza que fizesse a história andar.

O começo pode parecer chato e arrastado, e você fica torcendo para que a pobre menina chamada Marta, tão maltratada pelo pai, cresça logo e tenha uma vida interessante para você ler. Então, finalmente a garota cresce e  vai morar fora, recebe a notícia do grande trauma de sua vida, relacionado a sua irmã que sempre foi fraca e superprotegida. No entanto, continua sua vida sem voltar para casa…eu, mulher em uma fase de querer ler historias bonitas, vibro quando ela finalmente encontra um rapaz e começa a namorar…mas se você quer ver romance, esqueça, Francine pula toda a fase do namoro e vai direto para o casamento, me deixando muito brava por causa disso. Se a coisa mais legal de Amor de Redenção é ver a força do amor sacrificial, a conversa de A esperança de uma mãe é a força da mulher e o relacionamento entre mãe e filha. Se bem que a impressão que tenho é que o livro não foi escrito para deixar alguma mensagem, mas simplesmente para registrar uma história.

Posso estar sendo dura com a autora, mas o relacionamento entre Marta e seu esposo, por exemplo, é tudo o que você não deve fazer com seu marido. Leia o livro e faça tudo ao contrário. Ela o desrespeita o tempo inteiro e o reduz a um Zé Banana. Ele fica chateado, tenta brigar, parece muito triste, mas a autora nos leva a crer que os dois eram felizes assim, à sua maneira. Desculpe, não consigo acreditar que um homem consiga ser feliz com uma mulher tão chata dentro de casa. Isso me irritou, então talvez minha impressão do livro tenha sido prejudicada por essa irritação, mas no geral a história é bem construída, personagens convencem, mas parece ter informação demais condensada em suas quase quinhentas páginas, com Francine mastigando a história para você em alguns pontos, e fazendo saltos absurdos no tempo em momentos importantes da trama.

O livro também mostra o nascimento dos filhos do casal. Hidelmara é a segunda filha, ela é frágil e tímida, tem o temperamento semelhante ao do pai, mas Marta acha que ela parece com sua irmã Elisa, e teme que ela tenha o mesmo destino…para que isso não aconteça, passa a ser mais dura com Hildemara, que se sente rejeitada. Então você vê a menina crescendo, seu relacionamento com a mãe, sua personalidade…ela  conhece um rapaz e o romance também passa correndo diante dos seus olhos, porque Francine quer terminar logo o livro. Hidelmara tem seus filhos, adoece e a mãe se prepara para cuidar dela…no próximo livro. Sim, há uma continuação, mas ainda não foi publicada em português. Escrevi para a Editora Verus perguntando se há previsão de chegada do “Her daughter’s dream” ao Brasil, mas ninguém me respondeu até agora. “A Esperança de uma mãe” é um bom livro, mas não o compare com “Amor de Redenção”, nem espere muito romance. É um drama. Espere drama e você ficará feliz…rs…

PS: Como sempre, essa é a minha opinião. O ideal é que você leia o livro e volte aqui para dar a sua opinião. Isso se gostar de drama, é claro. A propósito, esse não é o tipo de drama que faz chorar,  ele faz pensar – e isso é bom.

Vanessa Lampert

Meu Blog:

https://www.vanessalampert.com

Você também me encontra no Twitter

E no Facebook